Ordem pública internacional do estado local

Marco Binhã/ Abril 24, 2018/ Areas de Atuação, Direito dos Negócios Internacionais

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Ordem pública internacional do estado local

→ Distingue-se da ordem pública interna, que são as normas jurídicas estruturais do ordenamento jurídico a que pertencem e que por isso revestem natureza imperativa, inderrogável pela vontade das partes. A ordem pública interna restringe a liberdade individual.

→ A ordem pública internacional do estado local, é uma excepção à aplicação do direito material estrangeiro competente à regulação de um determinado aspecto de uma relação jurídica plurilocalizada. Constituída pelos valores e princípios susceptíveis de caracterizar cada ordem jurídica face às demais em aspectos fundamentais de ordem jurídica, económica, política, religiosa, ética. A ordem pública internacional do estado local limita a aplicabilidade das leis estrangeiras. Constituem a ordem pública internacional do estado local, valores de eficácia extraterritorial quer-se dizer valores com eficácia de obstar á aplicação do direito material estrangeiro competente. Segundo Kegel é o reduto inviolável do sistema jurídico local.

→ Existem dois modos fundamentais de conceber a ordem pública do estado local:

– a concepção apriorística, em que a ordem pública internacional do estado local são normas de aplicação imediata, nomeadamente, leis de polícia e de garantia social, leis de aplicação geral isto é territorial. O reduto destas leis é insubstituível e só se procura a regulamentação jurídica dos aspectos que não se integram neste. É o sistema de Antoine Pillet, de Mancini. É também o que se verifica no art. 7.º da Convenção de Viena.

– a concepção aposterioristica, em que a ordem pública internacional do estado local é uma excepção à aplicação do direito material estrangeiro, não pela incompatibilidade em abstracto ou em geral desse direito com esta ordem pública mas pelo efeito intolerável manifestamente lesivo para a harmonia da ordem jurídica local que em concreto resultaria da aplicação daquele direito estrangeiro. É a concepção adoptada pela nossa ordem jurídica.

→ Tentativas de delimitação genérica do conteúdo da ordem pública internacional do estado local:

– critério da natureza dos interesses ofendidos. Mancini. A ordem pública internacional do estado local intervém sempre que estivessem em causa os interesses superiores do estado local. Quais são esses interesses superiores era o que interessa responder.

– critério do grau de divergência. O direito material estrangeiro será afastado sempre que tenha com o direito local uma divergência essencial. Também não é satisfatório.

– critério da imperatividade. Seriam de ordem pública internacional do estado local as normas rigorosamente imperativas deste. A imperatividade é características das normas de ordem pública, não delimitam o âmbito específico das de ordem pública internacional do estado local.

→ Pressupostos da aplicação da excepção de ordem pública internacional do estado local:

– o caso deve apresentar uma ligação suficientemente estreita com a ordem jurídica do foro para que a aplicação no seu seio da lei estrangeira tenha o impacto de chocar a consciência e provocar indignação para que se justifique o desvio à justiça do DIP da excepção à aplicação da lei julgada competente;

→ Características da ordem pública internacional do estado local:

– excepcionalidade;

– imprecisão;

– actualidade;

– relatividade no tempo e no espaço, própria de toda a justiça concreta;

→ Efeitos da excepção de ordem pública internacional:

– o afastar do direito material estrangeiro competente, sendo:

– eficácia proibitiva, impeditiva ou negativa, proíbe, com a excepção à aplicação do direito estrangeiro, uma situação, que não fosse a excepção seria por aquele direito permitida;

– eficácia permissiva ou positiva, permite, com a limitação do direito estrangeiro, uma situação que seria proibida pela aplicação daquele direito;

– eficácia atenuada da ordem pública internacional do estado local, ditada por razões de salvaguarda dos direitos adquiridos. Por exemplo a eficácia da ordem pública internacional no que trata da revisão e confirmação de sentenças;

→ afastada a aplicação daquelas normas materiais estrangeiras, aplicam-se, mantendo-se o respeito ao nosso DIP da ordem jurídica determinada por este como mais competente, as normas que nesse ordenamento podem ainda ser aplicadas ao caso em questão, ainda que com as devidas mínimas adaptações.

Não havendo ainda assim regulamentação jurídica apropriada nesse ordenamento jurídico competente, devemos recorrer às regras do direito interno português (maximização da lex fori) para colmatar esta lacuna de regulamentação – caso contrário estaríamos perante uma situação de denegação de Direito. Outra solução, porventura a mais correcta se entendida esta situação como uma verdadeira lacuna de regulamentação, seria uma atitude criadora do juiz, que visasse a maior eficácia do direito material mais adequado (não necessariamente o do foro) sem colidir com a ordem pública internacional do estado local. A solução da maximização da lex fori, indica que a lex materialis fori é em princípio a lei aplicável a todas as situações plurilocalizadas às quais o DIP não determine lei estrangeira competente.

→ Suposta integração do instituto da fraude à lei em DIP na ordem pública internacional do estado local:

– a repulsa da ordem jurídica local em aplicar direito estrangeiro que não é o que considera materialmente competente mas o que foi forçado a admitir como competente.

A ordem pública internacional do estado local visa obstar à aplicação do direito material estrangeiro competente, devido à repulsa em aplicar este direito, pela sua matéria na ordem pública local. A fraude à lei em DIP visa obstar à aplicação de direito material estrangeiro competente formalmente, mas não materialmente dado que só foi chamado aquele ordenamento jurídico em questão pela forma dolosa com que as partes alteraram o conteúdo do elemento de conexão decisivo e nunca por qualquer razão que se ligue com o conteúdo do direito estrangeiro. Daqui a autonomia do instituto da fraude à lei face à ordem pública internacional do estado local; A ordem pública internacional do estado local apenas protege a ordem jurídica local. O instituto da fraude à lei em DIP também reprime as fraudes à lei estrangeira.