Expulsão de estrangeiro ex-recluso

Marco Binhã/ Setembro 21, 2015/ Areas de Atuação, Direito Administrativo, Direito Constitucional, Direito Criminal, Direito da Família, Direito da Igualdade, Direito da Nacionalidade, Direito do Processo, Direito Internacional e Comunitário

O número de nacionais de países terceiros residentes em Portugal, a 1 de Janeiro de 2014, segundo a PORDATA, representava 3,8% da população residente.

Em Janeiro de 2006 o número de nacionais de países terceiros residentes na União Europeia, segundo o Eurostat “Statistics in Focus, Population and social conditions”, 1/2006, representava 3,8% da população residente.

A 1 de Janeiro de 2014, o número de nacionais de países terceiros residentes na União Europeia, segundo o Eurostat http://ec.europa.eu/eurostat/statistics-explained/index.php/Migration_and_migrant_population_statistics#Migrant_population representava 3,9% da população residente.

Tendo-se verificado um crescimento em números absolutos entre 2006 e 2014 na União Europeia de 18,5 milhões para 19,6milhões de nacionais de países terceiros residentes em território da UE.

Apesar dos magros números e do escasso crescimento dos mesmos a imigração continua a ser o principal factor de crescimento demográfico da UE e a maioria dos Estados-Membros regista uma migração positiva líquida.

Isto para concluir a partir destes dados que apesar das alterações de regime jurídico a tendência mantém-se a de um regime jurídico de entrada e permanência de estrangeiros restrito e exigente.

Segundo a Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais – Direção de Serviços de Organização, Planeamento e Relações Externas, até 31/12/2013 verificavam-se nas prisões portuguesas: a) 1.571 condenados por roubo, 1225 dos quais portugueses; b) 220 condenados por resistência e coação sobre funcionário, 194 dos quais portugueses; c) 381 condenados por ofensas à integridade física, 327 dos quais portugueses; d) 6844 condenados a pena de prisão efetiva, 3160 dos quais a pena de prisão efetiva superior a 6 anos, 246 dos quais a penas de prisão entre 20 a 25 anos de prisão efetiva.

Dos condenados acima referidos não se verifica que os 3160 condenados a pena de prisão efetiva superior a 6 anos constituam ameaça à ordem pública ou à segurança nacional do Estado Português.

O Estado Português dispõe no art. 15.º, n.º 1 da Constituição o princípio de equiparação pelo qual os estrangeiros que se encontrem ou residam em Portugal gozam dos direitos e deveres estabelecidos para o cidadão português.

O Estado Português define as condições e procedimentos de entrada, permanência, saída e afastamento de cidadãos estrangeiros do território português, pela Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, na redação revista pelas Lei n.º 29/2012, de 09/08, Lei n.º 56/2015, de 23/06, Lei n.º 63/2015, de 30/06.

Tal legislação é regulamentada na ordem jurídica portuguesa essencialmente pelo Decreto-Regulamentar n.º 84/2007, de 5 de novembro, na redação revista pelos Decreto Regulamentar n.º 2/2013, de 18 de março, pelo Decreto-Lei n.º 31/2014, de 27 de fevereiro e Decreto Regulamentar n.º 15-A/2015, de 2 de setembro.

Vários outros diplomas completam o regime nacional dos estrangeiros no que respeita ao controlo na passagem das fronteiras externas e permanência, saída e afastamento.

O regime jurídico disposto pela ordem interna coexiste com o regime jurídico disposto pela ordem jurídica da União Europeia.

A Lei n.º 37/2006

A Lei n.º 37/2006, no art. 134.º, n.º 1, alínea a) estabelece que é afastado coercivamente do território português o cidadão estrangeiro que permaneça ilegalmente no território português.

O procedimento de afastamento coercivo (PAC) só pode ser determinado por autoridade administrativa competente, designadamente, o diretor nacional do SEF, com faculdade de delegação, com fundamento apenas na referida alínea a) don.º 1 do art. 134.º (cfr. art. 145.º).

Durante a instrução do processo é assegurada a audição da pessoa contra a qual o mesmo foi instaurado, que goza de todas as garantias de defesa, devendo o instrutor promover todas as diligências consideradas essenciais para o apuramento da verdade (cfr. art. 148.º, n.º 1).

A decisão de afastamento coercivo, proferida pelo diretor nacional do SEF, ou em sua competente delegação, é susceptível de impugnação judicial.

No entanto o PAC tem mais limites à sua aplicação.

Nos termos do art. 135.º, alínea b) não podem ser afastados do território nacional os cidadãos estrangeiros que tenham a seu cargo filhos menores de nacionalidade portuguesa ou estrangeira a residir em Portugal, sobre os quais exerçam efetivamente as responsabilidades parentais e a quem assegurem o sustento e a educação.

Assim como nos termos do art. 135.º, alínea c) não podem ser afastados do território nacional os cidadãos estrangeiros que se encontrem em Portugal desde idade inferior a 10 anos e aqui residam habitualmente.

Os limites referidos são excluídos caso sejam alegados e comprovados no PAC o perigo para a segurança nacional ou à ordem pública que constitua a permanência do sujeito em território nacional.

Verificando-se um dos limites referidos no PAC este deve ser arquivado pelo órgão competente para a decisão.

Se concorrer com a verificação de qualquer dos referidos limites ao PAC a fundamentação de que o sujeito em causa constitui perigo para a segurança nacional ou à ordem pública, prevalece este último e o referido limite perda eficácia.

A segurança nacional ou a ordem pública deve ser mais valorada e assim prevalecer sobre os interesses individuais protegidos pelos referidos limites, designadamente, a família ou o direito ao desenvolvimento da personalidade.

Todavia, não é a contabilidade de condenações a que um individuo foi sujeito que determina o seu perigo atual para a segurança nacional ou para a ordem pública.

Ainda na Lei 23/2007, verificamos que o cidadão com autorização de residência válida tem direito ao reagrupamento familiar com os membros da sua família, nomeadamente o cônjuge (cfr. art. 98.º, n.º 1 e 2 e 99.º, n.º 1 alínea a).

O reagrupamento familiar pode ser solicitado pelo membro da família que se encontre em território nacional ou pelo titular da residência válida em Portugal (cfr. art. 103.º, n.º 2).

O pedido deve ser acompanhado dos seguintes documentos: a) Comprovativos devidamente autenticados dos vínculos familiares invocados; b) Cópias autenticadas dos documentos de identificação dos familiares do requerente; c) Comprovativo de que dispõe de alojamento; d) Comprovativos de que dispõe de meios de subsistência suficientes para suprir as necessidades da sua família, nos termos a definir em portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da administração interna, do emprego e da solidariedade social; e) Requerimento do membro da família para consultado registo criminal português pelo SEF, sempre que este tenha permanecido em território nacional mais de um ano nos últimos cinco anos; f) Certificado do registo criminal emitido pela autoridade competente do país de nacionalidade do membro da família e do país em que este resida há mais de um ano (cfr. art. 67.º, n.º 1 do Decreto-Regulamentar n.º 84/2007).

A apresentação de termo de responsabilidade que garanta a alimentação e alojamento ao nacional de Estado terceiro que pretenda entrar no País, bem como a reposição de custos de afastamento, em caso de permanência ilegal, subscrito por cidadão português ou cidadão estrangeiro habilitado a permanecer regularmente em território nacional, constitui prova da posse de meios de subsistência suficientes, sem prejuízo da possibilidade de apresentação de outros meios válidos de prova, podendo o SEF fazer depender a aceitação dos termos de responsabilidade de prova da capacidade financeira do seu subscritor, atestada, designadamente, através de um dos seguintes documentos: a) Declaração de liquidação do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) do ano anterior; b) Extrato de remunerações emitido pelos serviços da segurança social; c) Declaração com o saldo médio bancário; d) Os três últimos recibos de quitação dos valores auferidos pela prestação de atividade subordinada ou independente. (cfr. art. 5.º, n.º 1, 2 e 3 do Decreto-Regulamentar n.º 84/2007).

O processo de autorização de residência para o reagrupamento familiar deve ser decidido pelo diretor nacional do SEF, com faculdade de delegação, logo que seja possível ou no prazo de três meses, prorrogáveis por outros três meses, sendo que constitui deferimento tácito do pedido a ausência de decisão no prazo de seis meses após o pedido (cfr. art. 105.º, n.º 1 a 4).

O pedido de reagrupamento familiar pode ser indeferido nos casos em que o órgão competente para a decisão verifique que não estão reunidas as condições de exercício do direito ao reagrupamento familiar; quando o membro da família esteja interdito de entrar em território nacional; ou quando a presença do membro da família em território nacional constitua uma ameaça à ordem pública, à segurança pública ou à saúde pública (art. 106.º, n.º 1).

São interditos à entrada em território português os cidadãos estrangeiros que: a) não reúnam cumulativamente os requisitos legais de entrada; b) estejam indicados para efeitos de não admissão no Sistema de Informação Schengen; c) estejam indicados para efeitos de não admissão no Sistema Integrado de Informações do SEF; ou d) constituam perigo ou grave ameaça para a ordem pública, a segurança nacional, a saúde pública ou para as relações internacionais de Estados membros da União Europeia, bem como de Estados onde vigore a Convenção de Aplicação do Acervo de Schengen (cfr. art. 32.º n.º 1).

Da definição de perigo para a segurança nacional ou à ordem pública trataremos em secção própria do presente Requerimento.

São requisitos gerais de entrada ou saída do território do Estado Português: i) ser portador de um documento de viagem reconhecido como válido, cuja validade seja superior à duração da estada, o qual pode ser dispensado em certas situações ou substituído por outro dos documentos legalmente previstos (cfr. art. 9.º, n.º 1 a 6); ii) para a entrada em território nacional, devem igualmente os cidadãos estrangeiros ser titulares de visto válido e adequado à finalidade da deslocação concedido nos termos da presente lei ou pelas competentes autoridades dos Estados partes na Convenção de Aplicação o qual pode ser dispensado em certas situações excepcionais legalmente previstas (cfr. art. 10.º, n.º 1); e iii) não é permitida a entrada no País de cidadãos estrangeiros que não disponham de meios de subsistência suficientes, quer para o período da estada quer para a viagem para o país no qual a sua admissão esteja garantida, ou que não estejam em condições de adquirir legalmente esses meios (cfr. art. 11.º, n.º 1 a 3 e 12.º, n.º 1 a 6).

Os dados relativos aos estrangeiros indicados para efeitos de não admissão no Sistema de Informação Schengen (SIS) são inseridos com base numa indicação nacional resultante de decisões tomadas de acordo com as regras processuais previstas pela legislação nacional, pelas autoridades administrativas ou pelos órgãos jurisdicionais competentes.

As decisões podem ser fundadas no facto de a presença de um estrangeiro no território nacional constitua ameaça para a ordem pública ou para a segurança nacional. O art. 96.º, n.º 2 da Convenção de Aplicação do Acordo Schengen (CAAS) esclarece que podem se verificar fundamento para tal indicação nomeadamente: i) no caso de um estrangeiro ter sido condenado por um crime passível de uma pena privativa da liberdade de pelo menos um ano; ou ii) no caso de estrangeiro relativamente ao qual existem fortes razões para crer que praticou factos puníveis graves, incluindo o tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, ou relativamente ao qual existem indícios reais para supor que tenciona praticar tais factos no território de uma Parte Contratante do Acordo de Schengen; iv) ou ainda no caso de estrangeiro sobre o qual recaia uma medida de afastamento, reenvio ou expulsão que inclua ou seja acompanhada por uma interdição de entrada; v) ou no caso de estrangeiro relativamente ao qual recaia medida de afastamento, reenvio ou expulsão fundada no incumprimento das regulamentações nacionais relativas à entrada ou estada de estrangeiros (art. 96.º, n.º 3 da (CAAS)).

No Processo C-503/03 Comissão Vs Governo de Espanha o Tribunal de Justiça da União Europeia conclui que as circunstâncias que fundamentam a indicação no SIS são independentes de qualquer apreciação concreta da ameaça que representa o estrangeiro em causa.

Refere ainda o Tribunal a Declaração de 18 de Abril de 1996 relativa à definição do conceito de estrangeiro publicada no JO 2000, L239,de 22/9/2000, p. 458, http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=OJ:JOL_2000_239_R_0001_01&from=EN pela qual os Estados-Contratantes se comprometeram a só proceder ou manter a indicação de um nacional de um Estado terceiro, cônjuge de um nacional de um Estado-Membro, após ter constatado que a presença dessa pessoa constitui uma ameaça real, actual e suficientemente grave que afecta um interesse fundamental da sociedade na acepção da então vigente Directiva 64/221.

No referido processo o Tribunal condenou as autoridades espanholas com fundamento de que não tinham razão alguma para recusar a entrada aos interessados sem terem previamente verificado se a sua presença constituía uma ameaça real, actual e suficientemente grave que afectasse um interesse fundamental da sociedade.

São indicados para efeitos de não admissão no Sistema Integrado de Informação do SEF os cidadãos estrangeiros que: a) que tenham sido objeto de uma decisão de afastamento coercivo ou de expulsão judicial do país; b) que tenham sido reenviados para outro país ao abrigo de um acordo de readmissão; c) em relação aos quais existam fortes indícios de terem praticado factos puníveis graves; d) em relação aos quais existam fortes indícios de que tencionam praticar factos puníveis graves ou de que constituem uma ameaça para a ordem pública, para a segurança nacional ou para as relações internacionais de um Estado membro da União Europeia ou de Estados onde vigore a Convenção de Aplicação; e) que tenham sido conduzidos à fronteira, nos termos do PAC; f) são ainda indicados no Sistema Integrado de Informações do SEF para efeitos de não admissão os beneficiários de apoio ao regresso voluntário; g) podem ainda ser indicados, para efeitos de não admissão, os cidadãos estrangeiros que tenham sido condenados por sentença com trânsito em julgado em pena privativa de liberdade de duração não inferior a um ano, ainda que esta não tenha sido cumprida, ou que tenham sofrido mais de uma condenação em idêntica pena, ainda que a sua execução tenha sido suspensa.

Não obstante verificarem-se qualquer das situações que justifique o indeferimento do pedido de reagrupamento familiar, antes de ser proferida decisão de indeferimento devem ser tidos em consideração a natureza e a solidez dos laços familiares do cidadão estrangeiro, o seu tempo de residência em Portugal e a existência de laços familiares, culturais e sociais com o país de origem.

O princípio da proporcionalidade obriga a que a natureza e a solidez dos laços familiares do cidadão estrangeiro, o seu tempo de residência em Portugal e a existência de laços familiares, culturais e sociais com o país de origem, podem fazer prevalecer interesses individuais protegidos, nomeadamente o direito à família sobre os interesses em concreto de prevenção geral (cfr. art. 266.º, n.º 1 e 2, art. 36.º, n.º 1 a 7 e art. 26.º, n.º 1 e 4 todos da Constituição).

Não obstante, a Lei n.º 23/2007 não é aplicável a cidadãos nacionais de estados terceiros membros da família de cidadão português (cfr. art. 4.º, n.º 2, alínea c) e Acórdão do TJUE no Processo n.º C-50/06).

Não é aplicável o regime do PAC previsto na Lei n.º 23/2007 a cidadãos nacionais de estados terceiros membros da família de cidadão português.

Não é aplicável o regime do Reagrupamento Familiar previsto na Lei n.º 23/2007 a cidadãos nacionais de estados terceiros membros da família de cidadão português.

A Lei n.º 37/2006

A Lei n.º 37/2006, de 9 de agosto, regula o exercício do direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União Europeia e dos membros das suas famílias no território nacional e transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2004/38/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril e aplica-se a todos os cidadãos da União que se desloquem ou residam em Portugal, bem como aos seus familiares (cfr. art. 3.º, n.º 1).

Em especial as normas da Lei n.º 37/2006 sobre familiares de cidadãos da União aplicam-se aos familiares de cidadãos de nacionalidade portuguesa (cfr. art. 3.º, n.º 5).

A Lei n.º 37/2006estabelece:a) as condições que regem o exercício do direito de livre circulação e residência no território nacional pelos cidadãos da União e seus familiares; b) o regime jurídico do direito de residência permanente no território nacional dos cidadãos da União e seus familiares; c) as restrições aos direitos de livre circulação e residência dos cidadãos da União e seus familiares, fundadas em razões de ordem pública, de segurança pública ou de saúde pública (cfr. art. 1.º, n.º 1).

Para os efeitos da Lei n.º 37/2006 entende-se por Cidadão da União qualquer pessoa que tenha a nacionalidade de um Estado membro e por familiar, entre outros, o cônjuge de um cidadão da União (cfr. art. 2.º, alíneas a) e e.i)).

Nos termos do art. 15.º da Lei n.º 37/2006 os familiares do cidadão da União nacionais de Estado terceiro cuja estada no território nacional se prolongue por período superior a três meses devem solicitara emissão de um cartão de residência junto da direção ou delegação regional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras da área da residência, no prazo de 30 dias após decorridos três meses da entrada no território nacional (cfr. art. 15.º, n.º 1 a 2).

O incumprimento do prazo de requerer o cartão de residência pode ser passível de sanções proporcionadas e não discriminatórias.

O incumprimento do prazo não justifica por si só a preclusão do direito de residência atribuído, pode no entanto justificar a aplicação de taxas e coimas proporcionais e não discriminatórias (cfr. art. 9.º da Diretiva n.º 2004/38).

Para a emissão do cartão de residência é exigido ao interessado a apresentação dos seguintes documentos: a) Passaporte válido; b) Documento comprovativo da relação familiar como cidadão da União, designadamente certidão do registo civil de nascimento ou de casamento conforme o fundamento da atribuição do direito; c) certificado de registo do cidadão da União que acompanhem, ou no caso de cidadão português, cópia do cartão de cidadão; prova documental de que os descendentes diretos com menos de 21 anos de idade se encontram a cargo do cidadão da União, nomeadamente através de declaração do progenitor não requerente, confirmando o exercício do poder paternal pelo progenitor requerente, podendo, em casos devidamente fundamentados, ser dispensado (cfr. art. 15.º, n.º 4 alíneas a) a d), art. 37.º da Diretiva 2004/38 e art. 61.º, n.º 13, alínea b) do Decreto-Regulamentar n.º 84/2007.

O cartão de residência nos termos do art. 15.º deve ser emitido pelo SEF no prazo máximo de três meses a contar da apresentação do pedido (art. 15.º, n.º 5).

Decorrido o prazo de três meses dá-se o deferimento tácito do pedido (art. 15.º, n.º 5, conjugado com o art. 37.º da Diretiva 2004/38 e o art. 105.º, n.º 3, da Lei n.º 23/2007).

O direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos seus familiares, independentemente da nacionalidade, só pode ser restringido por razões de ordem pública, de segurança pública ou de saúde pública (cfr. art. 22.º, n.º 1).

As medidas tomadas por razões de ordem pública ou de segurança pública devem ser conformes ao princípio da proporcionalidade e basear-se exclusivamente no comportamento da pessoa em questão, a qual deve constituir uma ameaça real, actual e suficientemente grave que afecte um interesse fundamental da sociedade, não podendo ser utilizadas justificações não relacionadas com o caso individual ou baseadas em motivos de prevenção geral (cfr. art. 22.º, n.º 3).

A lei refere expressamente que a existência de condenações penais anteriores não pode, por si só, servir de fundamento à restrição ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos seus familiares, independentemente da nacionalidade (cfr. art. 22.º, n.º 4).

O princípio da proporcionalidade obriga que o SEF tome em consideração ao ponderar a aplicação de qualquer restrição ao abrigo do referido art. 22.º, n.º 1, nomeadamente, a duração da residência do cidadão em questão no território nacional, a sua idade, o seu estado de saúde, a sua situação familiar e económica, a sua integração social e cultural no País e a importância dos laços como seu país de origem (cfr. art. 22.º, n.º 4 da Lei n.º 37/2006 e ainda art. 266.º, n.º 1 e 2, art. 36.º, n.º 1 a 7 e art. 26.º, n.º 1 e 4 todos estes da Constituição).

O princípio da proporcionalidade obriga a que a duração da residência do cidadão em questão no território nacional, a sua idade, o seu estado de saúde, a sua situação familiar e económica, a sua integração social e cultural no País e a importância dos laços como seu país de origem, podem fazer prevalecer interesses individuais protegidos, nomeadamente o direito à família, à integridade física ou ao desenvolvimento da personalidade, sobre os interesses em concreto de prevenção geral.

Faculdade de Acesso à Nacionalidade Portuguesa

A faculdade de acesso à nacionalidade portuguesa pode ser útil à ponderação da concessão da autorização de residência a familiares de cidadãos portugueses.

O direito à nacionalidade concretizado na naturalização depende de concessão do Estado. Cada Estado determina quem são os seus nacionais (cfr. art. 3.º, n.º 1 da Convenção Europeia da Nacionalidade, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 19/2000, ratificada pelo Decreto Presidencial n.º 7/2000, vigente desde 1/2/2002 e art. 8.º, n.º 2 da Constituição).

No entanto, na sua essência, o direito à nacionalidade é um direito fundamental do indivíduo, como tal previsto em várias convenções internacionais (cfr. art 8.º, n.º 1 e 2 da Constituição e art. 15.º, n.º 1 e n.º 2 da Declaração Universal dos Direito do Homem).

No plano internacional, o Estado Português obrigou-se a permitir a aquisição da nacionalidade portuguesa aos indivíduos que sejam cônjuges de nacional português; bem como aos que residam legal e habitualmente em território português há um determinado período de tempo com início antes de atingirem a idade de 18 anos (cfr. art. 6.º, n.º 4, alínea a) e f) da referida Convenção Europeia da Nacionalidade).

Pela referida Convenção Europeia da Nacionalidade cada Estado Parte comprometeu-se a prever no seu direito interno a faculdade de naturalização de indivíduos legal e habitualmente residentes no seu território, comprometeu-se ainda que ao estabeleceras condições para efeitos de naturalização, esse Estado Parte estabelecerá um período de residência não superior a 10 anos imediatamente anterior à formulação do pedido (cfr. art. 3.ºda referida Convenção Europeia da Nacionalidade).

As citadas normas da Convenção são claras, precisas e incondicionais na determinação da faculdade de naturalização aos indivíduos abrangidos.

Tendo deixado à determinação do Estado apenas a definição do referido período de tempo de residência legal e habitual no território português, dentro do limite máximo de 10 anos.

Tendo o Estado português definido esse período, designadamente no art. 6.º, n.º 1, alínea b) da Lei da Nacionalidade aprovada pela Lei n.º 37/81, em seis anos.

O Estado Português viola as citadas disposições da referida Convenção ao estabelecer e ao aplicar normas que impedem tais indivíduos de exercer a faculdade de naturalização por terem sido condenados, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a 3 anos, segundo a lei portuguesa.

As normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas vigoram na ordem interna após a sua publicação e enquanto vincularem internacionalmente o Estado Português (cfr. art. 8.º, n.º 2 da Constituição).

De acordo com a hierarquia das normas, as normas constantes de Convenções Internacionais são superiores aos atos internos, independentemente da forma que revistam, designadamente, legislativa de valor reforçado ou não.

O valor do Direito disposto pela UE

Além de que as normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas vigoram na ordem interna após a sua publicação e enquanto vincularem internacionalmente o Estado Português (cfr. art. 8.º, n.º 2 da Constituição).

As normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais de que Portugal seja parte vigoram diretamente na ordem interna, desde que tal se encontre estabelecido nos respetivos tratados constitutivos (cfr. art. 8.º, n.º 3 da Constituição e art. 288.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia).

Todavia, a aplicabilidade direta do direito comunitário vai além da sua expressa disposição nos Tratados.

Sobre a aplicabilidade direta do direito comunitário refira-se os acórdãos do Tribunal de Justiça da União Europeia no Proc. 26/62 “Van Gend en Loos”, de 5/2/1963; Proc. 106/77 “Simmentahal”, de 9/3/1978; Proc. 41/74 “Van Duyn”, de 4/12/1974.

Refira-se ainda os Professores João Mota de Campos e João Luiz Mota de Campos, no “Manual de Direito Comunitário”, 2004, 4.ª Edição, Fundação Calouste Gulbenkian, p. 387 e ss.

As normas de direito comunitário, são normas jurídicas que vigoram na ordem jurídica interna, algumas das quais com aplicabilidade direta, nos termos acima expostos, sendo que regra geral, as que não são dotadas de expressa aplicabilidade direta são transpostas por Lei ou Decreto-Lei para a ordem jurídica interna.

Não obstante a transposição de uma diretiva, as normas desta constantes são diretamente aplicáveis pelos eventuais beneficiários, nos termos acima expostos, em caso de atraso ou deficiência na transposição.

A infração aos atos de Direito Comunitário pelo Estado Português constitui este em incumprimento e suscetível de responder perante a Comissão Europeia e o Tribunal de Justiça da União Europeia pela infração.

A Defesa da Ordem Pública ou da Segurança Interna

«No Processo C482/01 “Orfanopoulos” o Tribunal de Justiça da União Europeia resume que resulta do artigo 3.° da Directiva n.º 64/221 (o qual tem paralelo no art. 27.º da Diretiva 2004/38) que para as restrições fundadas na defesa da ordem pública serem justificadas estas devem fundamentar-se exclusivamente no comportamento pessoal do indivíduo em causa e o perigo e gravidade atuais desse comportamento para a ordem ou segurança pública. Tendo a Diretiva expressamente precisado que a mera existência de condenações penais não pode automaticamente justificar tais medidas.»

«Já no Processo 30/77, acórdão de 27 de Outubro de 1977 “Bouchereau” o Tribunal de Justiça da União Europeia havia fundamentado que o conceito de ordem pública pressupõe a existência, afora a perturbação da ordem social que qualquer infração à lei constitui, de uma ameaça real e suficientemente grave que afete um interesse fundamental da sociedade.»

«Sendo verdade que um Estado-Membro pode considerar que o uso de estupefacientes constitui um perigo para a sociedade capaz de justificar medidas especiais contra os estrangeiros que infringem a legislação relativa aos estupefacientes, a exceção de ordem pública deve, no entanto, ser interpretada de maneira restritiva, pelo que a existência de condenações penais só podem ser consideradas na medida em que as circunstâncias que lhes deram origem revelam a existência de um comportamento pessoal que constitua uma ameaça atual para a ordem pública(cfr. acórdão de 19 de Janeiro de 1999, “Calfa”, C-348/96).»

«É pacífico que não pode ser excluída, na prática, a possibilidade de que surjam entre, por um lado, a data das condenações penais e, por outro, a data da apreciação da expulsão, circunstâncias que impliquem o desaparecimento ou a diminuição significativa da ameaça que constituiria, para a ordem pública, o comportamento do sujeito (cfr. Acórdão no Processo C482/01 “Orfanopoulos”).»

«É contrário aos Tratados e ao art. 3.° da Directiva 64/221 a aplicação sistemática, baseada na presunção de que o sujeito estrangeiro condenado por delitos específicos deva ser expulso, sem considerações de ordem familiar respeitantes ao mesmo (cfr. Acórdão no Processo C482/01 “Orfanopoulos”).»

«Há que recordar, neste contexto, que foi reconhecida, no âmbito do direito comunitário, a importância de assegurar a proteção da vida familiar dos cidadãos comunitários para eliminar os obstáculos ao exercício das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado. É pacífico que excluir uma pessoa do país onde vivem os seus parentes próximos pode constituir uma ingerência no direito ao respeito da vida familiar tal como protegido pelo artigo 8.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que faz parte dos direitos fundamentais que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, são protegidos na ordem jurídica comunitária (Cfr. Acórdão de 11/7/2002 Proc. C60/00 “Carpenter”).»

«Sublinhe-se a necessidade de respeitar o princípio da proporcionalidade. Para apreciar se a ingerência em causa é proporcional ao fim legítimo prosseguido, no caso em apreço, a proteção da ordem pública, há que ter em conta, designadamente, a natureza e a gravidade da infração cometida pelo interessado, a duração da sua residência no Estado-Membro de acolhimento, o período que decorreu desde que foi cometida a infração, a situação familiar do interessado e a gravidade das dificuldades que o cônjuge e os seus eventuais filhos podem encontrar no país de origem do interessado (cfr. art. 8.° da CEDH e Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, acórdão Boultif c. Suíça, nº 54273/00, ECHR, de 2 de Agosto de 2001).»

A Comissão Europeia esclarece na Comunicação COM(1999)372sobre a referida Diretiva 64/221/CEE que o artigo 39.° CE e a Directiva 64/221 não se opõem à expulsão de um cidadão de um Estado-Membro que foi condenado a uma determinada pena por delitos específicos e que, por um lado, constitui uma ameaça actual para a ordem pública e, por outro, residiu vários anos no Estado-Membro de acolhimento e pode invocar circunstâncias de ordem familiar contra a referida expulsão, desde que a apreciação efectuada caso a caso pelas autoridades nacionais da questão de saber onde se situa o justo equilíbrio entre os interesses legítimos em causa seja feita de acordo com os princípios gerais do direito comunitário e, designadamente, tendo devidamente em conta o respeito dos direitos fundamentais, como a proteção da vida familiar.[1]

Mais esclarece na mesma Comunicação que qualquer medida de recusa de entrada ou de expulsão de cidadãos comunitários deve ser adoptada pelos Estados-Membros num contexto comum de respeito pelos direitos humanos e pelos princípios democráticos, o que implica não apenas que a aplicação das noções de ordem pública e de segurança pública pelos Estados-Membros deve ser interpretada estritamente, de modo a que o seu âmbito não possa ser determinado unilateralmente por cada Estado-Membro sem estar sujeito ao controlo das instituições da Comunidade, mas também que essa interpretação do direito comunitário assenta nos direitos humanos fundamentais, tal como os garante a Convenção Europeia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais.

A Comissão reconhece plenamente a necessidade dos Estados-Membros protegerem a sua segurança. O critério de segurança pública proporciona aos Estados-Membros um poder discricionário bastante vasto. Todavia, mesmo em questões muito sensíveis, este poder não é ilimitado, sendo necessária alguma transparência. Com base nas razões invocadas pelo Estado em causa, as instituições comunitárias deverão poder avaliar, no mínimo, se a pessoa constitui de facto uma ameaça para a segurança pública e se tal ameaça é suficientemente grave para justificar que se adotem medidas por razões de ordem pública.

A Comissão pretende destacar a importância de uma avaliação cabal de todos os factores pertinentes ao determinar se uma pessoa representa uma ameaça real e suficientemente grave que possa afectar um dos interesses fundamentais da sociedade. Tal avaliação pode implicar a consideração de, entre outros, os seguintes factores: natureza e gravidade das infracções cometidas, período de tempo decorrido desde que essas infracções foram cometidas e a situação geral do interessado. A evolução da situação pessoal reveste-se de especial importância nos casos em que a ameaça é avaliada bastante tempo após os actos que ameaçaram a ordem pública terem sido perpetrados, ou se se tiver passado muito tempo entre a decisão inicial e a sua aplicação ou quando a pessoa utiliza o seu direito de renovar o pedido. Quando se examinam os motivos de expulsão o bom comportamento durante o período de prisão deverá ter a mesma importância que quando, por exemplo, no caso de nacionais, se examina a possibilidade de conceder liberdade condicional.

Na mesma comunicação a Comissão Europeia esclarece que após a avaliação da ameaça, deverá analisar-se também se a medida é proporcional, tendo em conta todos os factores pertinentes e as circunstâncias pessoais actuais do interessado. As circunstâncias pessoais actuais podem aplicar-se ao período de tempo que a pessoa tenha residido no país, laços sociais, culturais e familiares com o país, bem como a sua integração actual na sociedade de acolhimento. O facto de uma pessoa ter nascido e ter sido educada no país de residência ou ter residido no mesmo desde tenra idade reforça consideravelmente os laços que a unem a esse país. Por outro lado, em tais circunstâncias reflete-se o comportamento da pessoa, tanto nos seus aspetos positivos como negativos, e pode ser avaliado em comparação com o comportamento de outras pessoas nacionais do país de residência, que se tenham formado na mesma sociedade. Os laços familiares da pessoa podem ser determinados, em parte, pela situação de pais e irmãos, se bem que a existência de cônjuge e filhos nacionais do país de residência, ou residentes de longa duração tenha especial importância. A avaliação geral pode também incluir a intensidade de laços com o país de origem (parentes, visitas e competência linguística) ou a inexistência de tais laços.

O Tribunal de Justiça da União Europeia fundamentou a limitação da margem de apreciação dos Estados-Membros para justificar a adopção de medidas de ordem pública com base em antigas condenações penais, declarando que a existência de condenações penais só pode ser tomada em consideração na medida em que as circunstâncias que deram lugar a essas condenações revelam a existência de um comportamento pessoal que constitua uma ameaça atual para a ordem pública. O recurso pelas autoridades nacionais à noção de ordem pública pressupõe, em todo o caso, a existência de uma ameaça real e suficientemente grave que afete um interesse fundamental da sociedade. Esta questão deve ser considerada pelas autoridades nacionais em cada caso individual no contexto do direito comunitário (cfr. Processo C 30/77 “Bouchereau” e Processo C-348/96 “Calfa”).

Quanto maior for a integração dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no Estado-Membro de acolhimento, maior deverá ser a protecção contra o afastamento. Só em circunstâncias excepcionais, quando existam razões imperativas de segurança pública, poderá ser aplicada uma medida de afastamento a cidadãos da União que tenham residido durante muitos anos no território do Estado-Membro de acolhimento, especialmente se aí tiverem nascido e residido ao longo da vida.

O conceito de «razões imperativas de segurança pública» pressupõe não apenas a existência de uma ameaça à segurança pública mas, além disso, que essa ameaça apresente um grau de gravidade particularmente elevado, refletido na utilização da expressão «razões imperativas».

O Tribunal de Justiça exemplifica que o ataque ao funcionamento das instituições e dos serviços públicos essenciais assim como a sobrevivência da população, ou o risco de uma perturbação grave das relações externas ou da coexistência pacífica dos povos, ou ainda um ataque a interesses militares, são situações que podem afectar a segurança pública (cfr. Acórdãos de 10 de Julho de 1984, Campus Oil e o., 72/83, Recueil, p. 2727, n.os 34 e 35; de 17 de Outubro de 1995, Werner, C-70/94, Colect., p. I-3189, n.o 27; Albore, já referido, n.o 22; e de 25 de Outubro de 2001, Comissão/Grécia, C-398/98, Colect., p. I-7915, n.º 29).

O tráfico de estupefacientes em associação criminosa constitui uma criminalidade difusa, dotada de meios económicos e operacionais impressionantes e que apresenta com grande frequência ramificações internacionais. Atendendo aos efeitos devastadores da criminalidade ligada a esse tráfico, a Decisão-Quadro 2004/757/JAI do Conselho, de 25 de Outubro de 2004, que adopta regras mínimas quanto aos elementos constitutivos das infracções penais e às sanções aplicáveis no domínio do tráfico ilícito de droga (JO L 335, p. 8), enuncia, no seu primeiro considerando, que o tráfico ilícito de droga constitui uma ameaça para a saúde, a segurança e a qualidade de vida dos cidadãos da União, bem como para a economia legal, a estabilidade e a segurança dos Estados-Membros.Com efeito, constituindo a toxicodependência um flagelo para o indivíduo e um perigo económico e social para a humanidade o tráfico de estupefacientes em associação criminosa pode apresentar um nível de intensidade susceptível de ameaçar directamente a tranquilidade e a segurança física da população no seu conjunto ou de uma grande parte dela(cfr. acórdão de 26 de Outubro de 1982, Wolf, 221/81, Recueil, p. 3681, n.o 9, bem como TEDH, acórdão Aoulmi c. França, de 17 de Janeiro de 2006, § 86).

O Parlamento Europeu em Resolução sobre o relatório da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre a aplicação das Directivas 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (direito de residência) considerou que o facto de uma condenação penal se traduzir sistemática ou automaticamente numa medida de expulsão constitui uma violação do direito comunitário do princípio de não-discriminação.

Na mesma Resolução chama a atenção para o facto de qualquer expulsão dever ser justificada em cada caso em função do risco permanente para a ordem pública e a segurança e dever ser ponderada minuciosamente à luz da situação pessoal do interessado e da protecção da vida dos membros da sua família.

Mais considera que a cidadania da União deve ser interpretada em sentido lato e que, portanto, não se devem expulsar os cidadãos de países terceiros nascidos no país de residência ou que tenham ido muito jovens para esse país, os residentes de longa duração que têm os seus vínculos culturais, sociais e familiares no país de residência (cfr. Resolução do PE in JOCE C135/189, de 7/5/2001).

À verdadeira constituição de ameaça à ordem ou à segurança pública nacional deve ser indiferente a nacionalidade do individuo, caso o mesmo constitua tal perigo deve ser sujeito a medidas cautelares.

A equiparação entre portugueses e estrangeiros e a proibição de discriminação obriga a justificar a distinção que se faça entre dois indivíduos que constituam igual grau de perigo à ordem e segurança pública nacionais.

O grau de perigo de ex-recluso de nacionalidade estrangeira de acordo com as condenações a que o mesmo foi sujeito pode ser semelhante ao de milhares de portugueses em Portugal, conforme as estatísticas de reclusos condenados acima referida.

Dos muitos milhares de portugueses condenados e que não se incluem na estatística referida por já não pertencerem à população reclusa e que constituem igual ou maior gravidade de perigo à ordem e segurança pública nacionais não consta que tenham sido sujeitos a medidas cautelares em face da gravidade do perigo que constituem.

O critério da defesa da ordem e segurança pública nacional não pode servir para discriminar entre nacionais e estrangeiros.

Tal seria flagrante violação da proibição de discriminação.

O que se verifica é que a condenação por crime é indicador da gravidade da ameaça que constitui o individuo à ordem e segurança pública nacionais, mas não é critério suficiente, caso seja, então inclua-se na ameaça a tais valores da sociedade, toda a população nacional residente condenada por crime semelhantes ou mais graves do que os cometidos pelo cidadão estrangeiro sujeito ao PAC.

O comportamento do cidadão estrangeiro ex-recluso pode indiciar a constituição de eventual ameaça à ordem pública e segurança pública, todavia, tal indício pode não subsistir à fundamentação exigida para o PAC, nem subsistir à análise ponderada com os demais valores a proteger, nomeadamente, a família daquele.

Seria a falência do sistema penal português orientado para a reintegração social do condenado, com vista à finalidade da prevenção especial positiva ou de prevenção, fundamentar com as meras condenações a que um individuo foi condenado por crimes que cometeu há lustros de anos atrás que o mesmo constitui uma ameaça à ordem pública ou à segurança pública nacionais (cfr. JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, “Direito Penal – Tomo I”, 2.ª Edição, Coimbra Editora, 2007, Pág. 78.º e ss.)

Referências:

     Comunicação da Comissão Europeia sobre a Diretiva 64/221/CEE, Bruxelas, 19.07.1999 COM( 1999)372 final;

     Migration and migrant population statistics
http://ec.europa.eu/eurostat/statistics-explained/index.php/Migration_and_migrant_population_statistics#Further_Eurostat_information

     PORDATA População Estrangeira em % da População Residente
http://www.pordata.pt/Europa/Popula%C3%A7%C3%A3o+estrangeira+em+percentagem+da+popula%C3%A7%C3%A3o+residente-1624

     Relatório da População Reclusa em Estabelecimentos Prisionais Portugueses
http://www.oi.acidi.gov.pt/docs/stats/justica/Reclusos%202011%20a%202013%20-%202.pdf

     Resolução do Parlamento Europeu sobre o relatório da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre a aplicação
http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:52000AP0207&from=EN

     Acórdão no Processo 30/77 REGINA/BOUCHEREAU
http://curia.europa.eu/juris/showPdf.jsf;jsessionid=9ea7d0f130d573221668219344f188ccdb2dce4ae4b5.e34KaxiLc3eQc40LaxqMbN4ObNqOe0?text=&docid=89572&pageIndex=0&doclang=pt&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=220233

     Acórdão no Processo C-50/06 Comissão e Países Baixos
http://curia.europa.eu/juris/showPdf.jsf?text=&docid=63238&pageIndex=0&doclang=pt&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=220652

     Acórdão no Processo C-60/00 CARPENTER
http://curia.europa.eu/juris/showPdf.jsf?text=&docid=47095&pageIndex=0&doclang=pt&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=220869

     Acórdão no Processo C-348/96 CALFA
http://curia.europa.eu/juris/showPdf.jsf?text=&docid=44353&pageIndex=0&doclang=pt&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=220988

     Acórdão nos processos apensos C-482/01 e C-493/01 ORFANOPOULOS E OLIVERI
http://curia.europa.eu/juris/showPdf.jsf?text=&docid=48717&pageIndex=0&doclang=pt&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=221265

     Acórdão no Processo C-503/03 Comissão e Espanha
http://curia.europa.eu/juris/showPdf.jsf?text=&docid=55480&pageIndex=0&doclang=pt&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=221437

s.m.o.

Dr. Marco Binhã.


[1] O princípio da não discriminação, no que respeita à proteção da vida familiar, fundamenta que deve haver equiparação entre o cidadão da união e o nacional de estado terceiro.

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