Direito Civil e Processo Civil

Marco Binhã/ Outubro 29, 2003/ Areas de Atuação, Direito do Processo

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Direito Civil e Processo Civil

Até meados do séc. XIX (1868, ano em que foi publicado, na Alemanha, o livro de Von Bulow), dominava a ideia de que era objecto do direito civil, o estudo de todas e quaisquer potencialidades jurídicas de agir para a prossecução de interesses privados, vendo-se, assim, quase todos os actos processuais como actos de direito civil. Todos os direitos, como o de acção ou o de fazer prova, entre outros, eram tidos como substantivos de direito civil. Restando para o processo pouco mais do que o estudo do modo prático da actuação em juízo.

É ilustrativo desta consideração que se dava ao direito processual civil, o currículo da Faculdade de Direito de Coimbra, em 1836. A esta data, passa a contar com a cadeira de ‘Jurisprudência, Formulária e Euremética’, onde se estudavam os formulários e descrições empíricas das praxes que, necessariamente, se realizavam no âmbito da sequência de actos que visava a resolução de um litígio.

 

Bulow, revolucionou, enunciando o processo, não como um prolongamento da relação jurídica civil, tal como até então se fazia, mas como uma relação jurídica autónoma da civil que se estabelecia entre os particulares e o tribunal, órgão do estado, que com ius imperii resolvia a lide. Evidenciando que esta nem podia sequer ser qualificada de civil por, pelo exposto, ter natureza de relação pública.

É desta concepção que surge a moderna ciência do processo civil.

O Direito Processual Civil, é um ramo do direito público, na medida em que é um conjunto de normas jurídicas que regulam a função jurisdicional de um órgão do estado, os tribunais, que intervêm nesta relação, que estabelecem com os particulares para a justa composição do litígio, munidos de ius imperii, com o fim último e primordial da realização do interesse público de ordem e paz social.

O Direito Processual Civil ser um ramo do direito público é indissociável dos sistemas de justiça pública.

Como já exposto, é desde meados do séc. XIX que o direito processual civil se autonomiza como ramo da ciência jurídica e só, então, deixa de fazer sentido o comportamento de Alciato, ilustre jurista italiano, do séc. XVI, que enjeita a paternidade dum compêndio de processo judiciário, sendo que este tema não era considerado digno dum jurista daquela estirpe. Alciato, chegou mesmo a acusar de abusiva a ligação do seu nome ao feito.

O reconhecimento mais nítido da autonomização do estudo do processo civil quanto ao direito substantivo civil é o direito de acção susceptível de ser exercido mesmo por aquele sujeito que, arrogando-se titular de certo direito substantivo, efectivamente, não o seja.

 

Apesar de autónomo do direito substantivo, o direito processual civil, estabelece e regula os meios de assegurar a tutela desses direitos, mediante a aplicação aos casos concretos da vida real, dos mesmos, pelo tribunal. Não são as normas de direito processual civil que determinam ou facultam a solução aplicável ao conflito de interesses suscitado entre os litigantes, nem a resposta para a questão da existência do direito invocado pelo requerente. O Direito Processual Civil é o meio para se alcançar tal, quer dizer, o Direito Processual Civil, apenas, regula o procedere, o caminho, a via legalmente prescrita, necessário para, com base no direito substantivo, se alcançar a solução concreta do conflito levantado entre as partes ou para se dar a realização efectiva do direito violado. O Direito Processual Civil é um meio, que regulando o processo judicial civil, existe, somente, em função da garantia de realização do direito substantivo civil e comercial[1]. Porque assim é, designamo-lo de direito adjectivo, evidenciando que é, simultaneamente, distinto do direito substantivo, mas, lhe adjacente, como um prolongamento ou acessório.

Situando-se no ponto nevrálgico da realização prática da justiça, resulta que, apesar do direito adjectivo, dogmaticamente, não determinar a resolução da lide, na prática, o seu imperfeito conhecimento é susceptível de comprometer a efectivação da tutela dos direitos e o êxito de pretensões justas.

O objecto do direito processual civil é o processo civil.

 

Processo civil, é um encadeamento, uma sequência juridicamente ordenada (o ramo de direito que o disciplina é o processual civil) de actos, que tem por finalidade a resolução definitiva[2] de um litígio de interesses privados.

Os actos que constituem o processo civil, chamam-se actos processuais. Do processo não fazem parte factos jurídicos em sentido estrito, estes ainda que tenham relevância terão de ser projectados no processo através de actos processuais. Um acto processual é um comportamento voluntário susceptível de produzir efeitos jurídico-processuais.

O objecto do processo civil, é o litígio.

 

Não obstante o termo processo, também, pode significar:

  • os autos, conjunto de papéis que integram o conjunto material do processo, onde estão exarados os actos processuais;
  • litígio, lide, causa, pleito ou demanda;
  • instância ou relação jurídica-processual;
  • acção ou direito de acção judicial;

Em Noções Elementares de Processo civil, da Coimbra Editora, 1976, o Prof. Manuel de Andrade identifica o direito processual civil com o processo civil em sentido lato.

[1] Desde o Código de Processo Civil, de 1939, que o processo civil e comercial, estão unificados.

[2] O termo procedimento reserva-se ao que visa uma providência provisória.